Essa newsletter se chama “Imperfeito” por que nasceu da minha vontade de ser menos perfeccionista e me aventurar mais em fazer coisas em que sou ruim. Por enquanto, essa vontade continua só isso mesmo: vontade. Falei sobre isso ontem nos meus Stories e uma amiga me lembrou deste texto que escrevi em 2015, depois de morar em Barcelona, no meu falecido blog Pequenos Monstros. Dei só uma melhoradinha no texto aqui e ali, mas ele é basicamente o mesmo.
// Antes do texto, só um rápido aviso: depois de muitos pedidos, resolvi criar um workshop de Notion, ensinando como você pode usar essa ferramenta pra TUDO de organização da sua vida, da mesma forma que eu uso. A primeira edição foi bem legal e a segunda acontece hoje, dia 11 de Janeiro, às 19:00. Ainda temos algumas vagas, então você pode se inscrever clicando aqui.) //
Vou contar um segredo para vocês: muitos dos posts que eu começo a escrever não chegam à luz da internet. Projetos, então, tenho milhões deles engavetados. Esse texto, por exemplo, era para ter sido criado quase um mês atrás, logo que fomos à Sagrada Família. Fiquei esperando aquele momento certo em que conseguiria pegar, escolher e editar todas as fotos como elas mereciam ser editadas. Uma tarefa impossível, pensando que estamos falando da Sagrada Família.
Essa minha tendência de começar as coisas e nunca terminar não é de hoje. Desde quando me entendo por gente lembro de ter problemas com isso. Sempre fui definido como uma pessoa perfeccionista. Meus pais, meus amigos, meus professores, todos eles sempre reclamavam ou elogiavam esse meu traço de personalidade. Eu achava legal ser perfeccionista, da mesma forma que achava bacana entrar na madrugada trabalhando, mas sempre sofri muito com esse meu perfeccionismo. A real é que essa vontade de fazer tudo o melhor possível, nos mínimos detalhes, tem atrapalhado minha vida.
Para mim, meu trabalho – e o dos outros também, pra falar a verdade –, nunca está perfeito. Sempre existe algo que poderia estar melhor, algo que poderia ser mudado. Criar aquele detalhe que é essencial, indispensável, mas que ninguém no mundo vai perceber, muito menos sentir falta, até que eu mostre todo orgulhoso “olha, e tem isso aqui!”.
“Poxa, legal!”
Isso, claro, acaba atrasando todos os meus prazos, me deixando mal em frente a cliente e acabando com a minha produtividade, bem como minha sanidade ou a das pessoas a minha volta. Diferente do que acham nas entrevistas de emprego, perfeccionismo não é algo para se orgulhar como um de seus defeitos.
Quando eu entrei na Sagrada Família uma coisa ficou bem clara para mim: aquele não é um lugar apenas megalomaníaco. Megalomaníaca é Dubai. A Sagrada Família é, acima de tudo, perfeccionista.
Cada detalhe, por mínimo que seja, foi pensado e planejado. Nada está lá simplesmente por estar. Cada cantinho tem um significado, cada número, cada cor, tudo conta uma história. Tudo tem um motivo de existir pro Antoni Gaudí, o arquiteto catalão que criou esse templo perfeccionista modernista.
É lindo, mas, ao contrário de quase todo ponto turístico do mundo, a Sagrada Família ainda não está pronta. Você entra e, enquanto fica maravilhado com toda a arquitetura, existe uma música de fundo: um quebra-quebra, uma martelada sem fim. Sem fim mesmo, pois são 113 anos de obras, ela ainda está longe de ser terminada. CENTO E TREZE ANOS.* [ a promessa agora, em 2024, é que ela fique pronta em 2026]*
É claro que Gaudí não era tão doido a ponto de achar que conseguiria ver ela terminada. “O meu Cliente não tem pressa”, ele dizia se referindo a Deus. Tá aí uma coisa que não posso aplicar para nos nossos clientes ~menos gloriosos~, né? Na verdade, ele até planejava que a construção fosse durar centenas de anos, o que foi acelerado pela nossa tecnologia de hoje.
Essa falta de prazo de Deus, levanta a questão: se meu cliente me desse prazo infinito, quanto tempo eu iria demorar para entregar meu trabalho? É esse o problema com projetos pessoais. É o mais próximo de ter uma divindade (pelo menos em termos de prazo) como cliente.
“Ah, mas vai valer a pena! A Sagrada Família vai ficar incrível!”. E vai mesmo. Já está, inclusive. Só que – e é óbvio que eu não tô me comparando ao Gaudí –, de um perfeccionista para outro: vale todo esse esforço?
Gaudí pegou o projeto da obra em 1883, um ano depois do seu início de verdade. Como bom perfeccionista, olhou o que tinha sido feito até então, resolveu jogar tudo fora e começar do zero. Como um bom perfeccionista, dedicou grande parte do seu tempo (e exclusivamente os onze últimos anos da sua vida) a criar essa obra. Como um bom perfeccionista, morreu, em 1926, sem nem um quinto dela completa.
“Mas o teu trabalho sempre vale essa espera” é uma frase que eu ouço sempre, mas vale para quem, né? Não ver um projeto desses pronto durante sua vida, nem na dos seus filhos e talvez nem netos? Não ver o teu projeto sair da gaveta vale teu perfeccionismo?
Pra piorar, muito dos desenhos e projetos do Gaudí foram destruídos durante a Guerra Civil Espanhola, e hoje eles fazem uma recriação a partir de cada pedacinho que foi encontrado, tentando chegar ao que ele queria dizer. Se eu abrir a janela de casa agora, consigo ouvir ele gritando do túmulo ao ver a galera fazendo qualquer coisa um milímetro diferente do que ele planejou. Afinal, um bom perfeccionista não é muito fã de delegar tarefas.
Eu poderia falar em como é incrível o teto, com colunas que imitam troncos de árvores, como é de chorar quando entram as luzes coloridas pelos mosaicos, pintando toda a igreja de cores diferentes ao longo do dia. Poderia te falar como as duas fachadas construídas (a principal ainda não está pronta) são tão diferentes entre si e tão fantásticas. Como tudo é grandioso e lindo. Como os funcionários são bem simpáticos e o audio guide vale bem a pena. Poderia te falar também que a subida na torre é bem rapidinha, mas que é demais ver Barcelona lá do alto. Poderia também avisar para comprar ingressos pela internet para não pegar fila. Poderia ter colocado mais fotos – como bom perfeccionista, tirei mais de 800 delas! – ou editado elas melhor. Poderia ter criado um mapa da Sagrada Família com detalhes que ninguém vê, mostrar como está previsto ficar a obra finalizada, em 2026.
Eu poderia deixar esse texto ainda melhor, mas hoje não. Hoje eu vou lutar pelo menos um pouco contra essa minha mania e subir esse post na hora que preciso subir. Porque esse é o problema com o perfeccionismo: ele te impossibilita, te paralisa, fazendo você acreditar que é pro melhor e, quando você vê, 113 anos se passaram e o teu projeto ainda não está pronto.
Agora, vamos lá, pelo menos o Gaudí ainda tinha a desculpa de criar um negócios desses, que virou símbolo de Barcelona, um dos pontos turísticos mais visitados do mundo e que pretende ser a mais alta igreja da história. Mas qual é a nossa desculpa para deixar o perfeccionismo consumir nossa vida, nossos prazos, nossos trabalhos e nossa sanidade?
Meu maior orgulho dos últimos tempos
Como bom perfeccionista, gastei algumas muitas horas nos pequenos detalhes do novo site do CR_IA e estou muito orgulhoso de tudo que fiz sozinho (com uma ajuda da inteligência artificial, claro). Vou adorar se você entrar lá pra ver!
Semana que vem, com a nova turma do CR_IA (inscreva-se!), começa uma nova fase nesse projeto, cheia de novidades, como comunidade no Discord e eventos online recorrentes para membros. Já somos mais de 230 alunos. Tô bem animado com tudo que tá rolando e o que está prestes a rolar. Seria muito legal ter você junto nessa!
O que eu tenho feito
Jogando Conexo.ws todo dia. Minha avó também ficou viciada e sempre que eu a encontro, ela pergunta se não tem um novo jogo pra ela fazer.
Trabalhando muito, mais do que deveria, para fazer o novo site e área de membros do CR_IA (esse poderia ser um resumo das minhas últimas semanas)
Planejando meu Carnaval em BH. Eu e alguns grupos de amigos decidimos que este é o ano de finalmente conhecer a capital de Minas. Estou animado!
Ajudando algumas pessoas com o Marketeiro de Aluguel. É minha consultoria de uma hora que te ajuda a resolver seus problemas. Recentemente foi um jornalista que quer pensar em um novo negócio pra tocar e uma estrategista que quer se reposicionar pro mercado de fora.
Assisti Saltburn. E a música do final não sai da minha cabeça (e da minha playlist). Também assisti e vale a pena: How to Have Sex e Bottoms (esse é uma maluquice)
Passei o ano novo sem contagem regressiva e agora me sinto ainda preso em 2023. Contagem regressiva é importante pra mim!
Defini minhas metas para 2024. São 37 metas. Tô pior que a ONU, tá doido. 🫠 (mas ok, vai, priorizei 8 delas)
Fiz um conteúdo com dicas de como cumprir suas metas em 2024. São coisas simples, mas que todo ano que sigo, me ajudam muito!
Descobri que eu nunca dormi direito na vida. Fiz polissonografia e deu 61 interrupções de sono por hora. O normal é menos de 5 e acima de 30 é severo. Ainda quero falar mais sobre isso.
(As fotos desse post não foram feitas por IA, veja só!, elas foram tiradas por mim em 2015, quando morei em Barcelona. Saudades de tirar fotos, inclusive!)