Como criar uma família fora de casa
Uma das coisas mais importantes que aprendi morando fora é a importância das conexões.
Domingo eu fui num date. Finalmente. (Tinha escrito essa newsletter na segunda-feira, aí tudo isso fazia mais sentido.) De qualquer forma, desde fevereiro que eu não ia num date com uma pessoa nova. Marcamos, meio em cima da hora, de nos encontrar a noite. Mesmo sendo no bar mais perto aqui de casa – um grande clássico de dates –, cheguei 4 minutos atrasado, o que é engraçado de contar pra alguém que é de São Paulo, mas já era tempo suficiente pra deixar meu date esperando.
Me considero uma pessoa relativamente boa de date. Sou fácil de conversar e isso já é meio caminho andado. Gosto de pular aqueles tópicos de sempre quando você conhece alguém: o que te traz aqui? de onde você é? com o que você trabalha? Inclusive, ao contrário do que diria minha paulistanidade, eu odeio falar de trabalho. Acho meu trabalho super interessante, mas raramente falo sobre ele. Até porque, se eu começar a falar sobre IA, estratégia e criatividade, não paro mais. No domingo, 15 minutos no bar e já estávamos no tópico de como é importante encontrar família em grupos de amigos.
Talvez seja um assunto que você também se identifique. Eu diria que a maior parte das pessoas que me acompanham moram longe das suas origens. Do outro lado do mundo, em outro país, em outro estado, cidade. Muitos de nós tivemos que aprender a nos conectar profundamente com gente que não tem qualquer obrigação de sangue de estar ao nosso lado.
Tenho a sorte de ter construído algumas dessas famílias. Tenho o privilégio de ter uma ótima relação com minha família de sangue. Aqui em Berlim tenho um grupo de amigos muito próximos que vejo toda semana e até levam comida quando um de nós fica doente. Essa semana mesmo, uma dessas amigas veio tomar banho aqui em casa porque a casa dela estava sem água quente.
Nem sempre essas famílias precisam ser pra toda vida – e aqui eu vou me permitir usar uma ideia mais fluída do que é família. Também sou a favor das famílias temporárias, aquele grupo de amigo que só existe naquele momento do tempo e espaço, mas de uma forma muito intensa e profunda. Aquele grupo que estava lá, quase que para um objetivo específico, mas que trazem o suporte que precisamos no momento que precisamos.
Nessa vida nômade que às vezes eu vivo, tive que aprender a chamar alguns lugares de casa muito rapidamente e – por que não? – também considerar quase como família alguns grupos que conheci semana passada. Acho que a diferença está no quanto você se deixa aberto para essas novas relações.
Quando morei em Beirut em 2019, dei a sorte de fazer um grupo incrível de amigos. A gente conversava de tudo, se via quatro vezes pro semana, fazíamos jantares, íamos em balada, passávamos madrugadas bebendo, até dormíamos juntos às vezes. Quase nunca mais vi nenhum deles depois que saí da cidade, mas eles foram exatamente o que mudou minha vida por lá, eles foram minha família por aqueles dois meses. Exatamente o que eu precisava.
Claro que tempo é essencial e o verdadeiro juiz da construção de relações realmente significativas e profundas como de uma família, mas acho que o espaço que você dá pra isso é tão essencial quanto. Essa foi uma conversa que tive bastante com meu date no domingo. Para mim, desenvolver grandes conexões com as pessoas é algo que acabou ficando mais natural com o tempo, mas não deixa de ter uma receita, que precisa de seus ingredientes.
Para começar, esforço. Eu me esforço muito para me conectar mais com gente que eu vejo que tem potencial. Não tem aquela de “deixa acontecer naturalmente”, porque eu sei bem que a minha vida atropela o naturalmente e nunca mais verei aquela pessoa na minha vida se não eu não me esforçar pra isso. Conheci alguém que eu gostei? Já marco de ver na mesma semana.
Eu, inclusive, tenho tarefas recorrentes no meu gerenciador de tarefas pra poder lembrar de ligar pra algumas pessoas, até minha avó. Também me forço a lembrar de mandar mensagem recorrente pra amigos que eu gosto. Se não for assim, piscou e passou um mês. Eu nem percebi. A vida é cheia dessas piscadas.
Também não posso pedir conexão se eu mesmo só ficar naquelas conversas nível “tempo doido, né?” e não posso esperar que essa atitude venha do outro, então ser vulnerável é essencial. Eu compartilho muito da minha vida e do que sinto esperando que isso deixe a outra pessoa também confortável em falar de si. Sempre funciona.
Outro ponto dessa receita é só ser curioso e realmente interessado em quem está na sua frente. Parece bobo, mas muitas vezes a gente – em situação de date ou só na amizade - tá tão preocupado em mostrar que somos legais que esquecemos de dar espaço pra outra pessoa falar de si. Isso também é essencial para qualquer conexão.
Morar longe de casa não é pra todo mundo. É um ato de coragem. Muita gente que conheci acabou voltando pra suas origens e um dos principais motivos é a solidão de ter que construir uma vida social do zero. Atualmente é algo mais fácil pra mim, mas muito disso veio com a prática nesses nove anos morando fora. Essa combinação de esforço, vulnerabilidade e curiosidade sempre me ajudou nesse processo. Como você encontrou seu último grupo de amigos com quem você realmente se conectou? Qual foi o processo?
O que eu tenho feito:
Criado scripts pra tudo. Outro dia eu me peguei achando mais fácil criar um script pra transformar fotos em um vídeo do que abrir qualquer programa. Funcionou.
Testando novas formas de fazer vídeo com IA. Tem sido um processo interessante e quero começar a documentar tudo nas redes do CR_IA e no curso em si.
Organizando minha vida. Essa semana voltei a fazer meu caderninho em que eu checo meus hábitos. Vamos ver quanto dura.
Cansado de ter que ficar entre o Twitter, o Bluesky e o Threads. Chega de rede nova, gente.
Ido em dates. Escrevi a maior parte do texto aí de cima na segunda, mas desde lá já fui em dois outros dates. Ontem fomos parar, do nada, numa festa de casamento.
Já preparando a próxima turma do CR_IA. (Vou só divulgar na segunda, mas provavelmente já vou abrir as vagas aqui no site este fim de semana.)
Ajudando a Debbie a fazer o novo site dela sobre como viajar com animais. Dessa vez em inglês.
Criando novos processos de criação de conteúdo. O meu Notion está cheeio de conteúdos. Agora só falta a parte mais chata: gravar.
Tentando parar de trabalhar todo dia antes das 18:00. Essa semana eu consegui 3 dias de 5. Sucesso?
Me acostumando com meu novo notebook. Sim, agora eu estou de carro novo! É quase o mesmo preço mesmo, mas eu estava precisando muito.
[As imagens de hoje foram todas criadas por mim usando o Midjourney. O prompt foi umas variantes de “awkward family photo with an alien, 1965, estabilishing shot, inspired by Daniel Clowes and Stalenhag and JC Leyendecker. wes anderson style, Brazilian scene --ar 3:2”]
Fê, não tô mais usando o Instagram, então estou por fora dos seus planos para o curso de AI, do qual sou aluna. Não sei se vc já disse algo do gênero, mas eu tava pensando como seria massa se vc transformasse o curso num modelo de recorrência que a gnt pudesse pagar mensalmente para ter acesso aos seus estudos sobre AI! :)
É meio bizarro isso de família fora de casa. Fui a um acampamento em 2017, e tenho as pessoas daquela ÚNICA SEMANA juntos no meu coração pra sempre e para tudo que for necessário. Já revi, já saímos, as vezes ligamos atualizando da vida e passamos horas em vídeo chamada rindo dos desastres uns dos outros.
Acho ao mesmo tempo delicioso e assustador, como um tempo tão pequeno pode ser tão imersivo e gerar uma conexão - de almas? - tão intensa. Parabéns pelo texto Fê, acho que sou tiete porque sempre venho comentar ou faço notas mentais do que acho. E você sempre me inspira a escrever - talvez no mês que vem eu comece minha própria newsletter. Quem sabe!? Thanks <3