Semana passada chegou meu novo laptop. Perdi um rim nessa, mas estou bem feliz com ele. O meu antigo é um guerreirinho, usava desde 2017, quando fui forçado a trocar porque meu notebook anterior simplesmente deu pau e parou de funcionar.
Eu morava em Roma, fui levar para consertar e me falaram “seu notebook é vintage, não tem nem reza”. Pro italiano isso é coisa séria. Eu, na época cheio de trabalhos pra entregar, corri atrás de um novo. Ou melhor, voei. Fui dia seguinte passar o fim de semana em Nova York porque, entre passagem comprada por milhas e ficar na casa de uma amiga, eu conseguiria economizar quase mil euros na diferença do preço entre o notebook nos EUA e na Europa.
Pois bem. Depois de seis anos sendo usado e abusado todos os dias – segundo meus apps aqui, eu uso meu laptop uma média de 16 horas por dia –, o pobrezinho estava já nas suas últimas. Antes dele simplesmente desistir de tudo, pedir demissão de forma épica e ainda postar o vídeo no TikTok, tive que ir atrás de um substituto. É ótimo, exatamente do jeito que eu queria, com uma excessão (ou eu deveria dizer excess±ao?): acho que errei na hora de selecionar o teclado.
Sempre usei o teclado em inglês. Na hora de montar meu notebook, fui direto nele, mas aí eles te dão a opção de britânico, americano ou internacional. Eu, internacional que sou, selecionei o internacional mesmo sem nem pesquisar sobre (um erro mirim, concordo). Agora estou aqui, sofrendo as consequências de meus atos.
Ok, estou sendo dramático. Basicamente, a única diferença é a adição de uma teclinha, a que me permite digitar facilmente os símbolos ± e §, que todos nós, internacionais, usamos todos os dias e realmente merece um espaço nobre em qualquer teclado. A adição desta maldita fez o meu til e minha crase serem rebaixados para o lado do Shift e –vejam a audácia! – diminuíram o próprio espaço do Shift. Aliás, não consigo entender porque o Caps merece um espaço maior que o Shift. A vida é injusta em vários aspectos mesmo. O Enter também mudou um pouco de posição e deixou de ser horizontal para ficar vertical. São pequenas mudanças que deixam qualquer um (eu) maluco.
Apenas para quest±oes – que raiva essa tecla fora do lugar! – de argumento, vamos fingir que você tem empatia com este meu grande white-people-problem da semana. “Poxa, Fe, que barra! Tadinho. Força, guerreiro!” Obrigado, eu sei, mas sou forte e não estou aqui para chorar. Estou aqui porque essa situação em que me encontro me faz pensar, a cada til, sobre nossa habilidade de criar padr±es e de adaptaç±ao (ou, às vezes, a falta dela, aparentemente).
Quando falamos de trabalho criativo e de produtividade, acho que existe a necessidade de um equilíbrio entre processos rotineiros, que deixem nossos neurônios de folga jogados no sofá comendo pipoca e assistindo Emily in Paris, e momentos de grande ativação, recebendo novas ideias, as tratando, conectando pontos e tentando criar algo novo em cima disso.
Muito do primeiro faz a gente viver uma vida sem graça, no automático. Muito do segundo, faz a gente não conseguir dar conta de nada e parecer um filhote de golden retriever dentro de um supermercado numa promoção do Cartoon Network onde você tem 10 minutos para pegar o que quiser. Sim, altamente específico.
Esses processos rotineiros podem ser para qualquer coisa. Todos os dias eu acordo e, automaticamente, coloco meu relógio, meu fone de ouvido, dou play em um podcast, vou fazer xixi, escovar os dentes, arrumo a cama, faço uma xícara de chá. (Hoje, no caso, estou bebendo terere, então se este texto não fizer o mínimo sentido, sabemos que cafeína culpar.) Tem gente que sempre toma o mesmo café da manhã, outros malucos só usam a mesma roupa. Tudo isso serve para não gastar hd mental com algumas pequenas decisões. A gente mal percebe, mas de pequena decisão em pequena decisão, é fácil a gente ficar exausto.
Você não precisa mudar toda sua vida e estilo só para ganhar uns minutos do dia a dia, mas acho bem válido transformar tarefas repetitivas em processos e tentar encontrar como deixá-los mais eficientes. É a parte de parar de pensar, deixar algumas coisas no modo automático e reservar sua energia para o que importa.
Tem uma cena dessa nova temporada do The Bear onde o Carmy, chef e personagem principal da série, está cronometrando quanto tempo gasta entre uma ilha e outra na cozinha para poder planejar melhor o espaço. Coisa de maluco? Sim, mas são pequenas coisas que fazem muita diferença no cotidiano das tarefas repetitivas. Experimenta mudar de lugar a gaveta onde você guarda os talheres e nunca mais usarás uma colher na vida.
Inclusive, você normalmente sabe onde estão os talheres e copos de qualquer cozinha que você entra porque todos nós montamos nossa cozinha de forma parecida. Uma forma que já foi testada e melhorada com anos de estudos, que deu origem 100 anos atrás ao que eles chama de Frankfurt Kitchen, pensada na melhor eficiência do dia a dia (olha a comparação no esquema abaixo). Se você entrar na casa de alguém e a gaveta de talheres for a terceira gaveta ao invés da primeira, fuja porque essa pessoa não deve ser normal. Sério.
As teclas de um computador não são tão diferentes assim de uma cozinha – sim, “analogy is my passion” –, onde a posição de tudo foi planejada e pensada para melhor eficiência. No caso, foi pensada pelo próprio inventor da máquina de escrever. Além de deixar as teclas mais usadas no centro do teclado, evitando voltas desnecessárias dos dedos, ele também percebeu que, nas máquinas mecânicas com alavancas, as teclas se enroscavam mais se você digitasse letras que estão muito próximas umas das outras. Tipo se você fosse digitar “ASA” no teclado atual ia travar tudo. Para resolver isso, ele resolveu jogar as letras que são mais usadas juntas para lados opostos do teclado. Isso tudo no inglês e pensando nas máquinas de escrever, claro.
Acabamos mantendo esse teclado QWERTY – é o nome da configuração por causa das seis primeiras letras dele –, mesmo depois que as alavancas da máquina de escrever deixaram de ser um problema, pelo mesmo motivo que estou com tanta dificuldade de escrever este texto sem adicionar um ± no meio das palavras: inércia tecnológica. Uma vez que a gente fica acostumado a certos processos, fica difícil de nos adaptarmos a novos. É a mesma coisa da gaveta de talheres.
Essas analogias da cozinha e do teclado podem nos ajudar a criar processos pro nosso dia a dia: como eu posso deixar isso que eu faço todo o dia mais eficiente? como eu posso criar o ambiente ideal para que eu faça esta tarefa da melhor forma? Justamente por ser uma pessoa mentalmente caótica e aleatória – já provado pela quantidade de assuntos que estou tentando colocar em uma mesma newsletter –, sou um grande fã de processos. Eles me mantém focados em algumas tarefas que precisam ser feitas para que eu possa brilhar naquilo que eu faço melhor.
Tenho falado bastante sobre isso nas aulas-magnas do CR_IA, o meu curso sobre como você pode usar inteligência artificial no seu dia a dia para aumentar sua criatividade e produtividade. Acredito muito no poder de adicionar IA em alguns de seus processos, especialmente para aquelas tarefas repetitivas, chatas e que estão te prendendo. Mas tem que saber fazer isso direito.
Muitas vezes esses processos começam meio forçados, devagar. (Quem nunca catou coquinho digitando num teclado nos anos 90?) Muitas vezes, criar e melhorar o processo demora mais do que a tarefa em si, mas é uma questão de adaptação e prática. Dessa vez eu consegui lembrar de apertar a tecla certa para o ~ no lugar do ±.
Outro ponto importante, é ser adaptável com seus processos. Se eles não forem maleáveis e permitirem mudanças, vai ser muito difícil deles funcionarem no seu dia a dia. 🎋*“O bambu se curva ao vendaval para não se quebrar”*🎋, como diria a frase inspiradora no grupo de vó do WhatsApp mais próximo de você. Parte da criação de um bom processo é a adaptabilidade.
A mesma adaptabilidade essencial para sobreviver a qualquer mudança tecnológica – incluindo tudo que vem pela frente com IA – e que vai, com sorte, garantir que o ± pare de aparecer nos meus textos. Um dia.
O que eu tenho feito:
Aproveitando o verão berlinense, andei 50 kms de bike no fim de semana. Também consegui desencaixar a corrente de duas bikes diferentes nesse espaço de tempo, mas agora aprendi a consertar.
Ontem lancei uma nova turma do CR_IA e recomendo muito que você vá lá se inscrever!
Fui a um lago entre os passeios de bike. Segue foto de como estava tranquilo o ambiente:
Criando novos templates de Notion para organizar a vida. Em especial, para CRM e conteúdo. Dessa vez para minha amiga Lu Levy.
Tomei um drink caríssimo (16 eur) no melhor bar da Alemanha. É caro, mas eu gosto muito desse lugar.
Tenho competido com meus amigos no Fitness. Pedi todo mundo que usa Apple Watch pra me adicionar e agora eu estou mais maluquinho com essa história de exercícios. Quem diria.
Montando novas consultorias de IA para empresas. Ultimamente tem aparecido bastante de empresas que querem treinar seus funcionários para usarem melhor as ferramentas de IA.
Fazendo casas da Barbie com a ajuda de IA. Me diverti muito com isso hoje. Tem várias aqui no meu Twitter e no Instagram do CR_IA. Segue uma exclusiva para esta newsletter, no estilo do arquiteto egípcio Hassan Fathy:
Ufa, acho que por hoje é só. Estou bem orgulhoso que esta é a terceira semana seguida que eu consigo mandar essa newsletter. Não sei se tem gente realmente lendo tudo isso, mas vamo que vamo!
soltei várias risadinhas ao longo do texto, com direito até a pequenas bufadas de ar pelo nariz. obrigada por melhorar minha tarde
Eu curti especialmente essa! Você escreve muito bem.